O sequestro dos corintianos na Bolívia

(Foto: Daniel Rodrigo/22..2.2013/Reuters)
(Foto: Daniel Rodrigo/22..2.2013/Reuters)

Há 33 dias, quando um torcedor corintiano lançou um sinalizador contra a torcida da Bolívia, em uma partida da Libertadores, e matou um adolescente de 14 anos daquele país, defendi que houvesse uma punição bem dura, ao clube e aos responsáveis, para evitar esse tipo de tragédia no futuro e servir de lição a outras torcidas organizadas (que mais parecem gangues) do país.

Desde então, o Corinthians já foi obrigado a manter as portas fechadas em um jogo no Pacaembu, o que representou prejuízo de R$ 1,3 milhão, recebeu uma multa extra de R$ 200 mil, ainda está proibido de ter torcida em jogos fora de casa por 18 meses e participou de amistoso cuja renda foi revertida para a família da vítima.

Considerando que a falha de fiscalização para a entrada de uma arma no estádio não é de responsabilidade exclusiva do clube, mas também dos organizadores, acho que a punição já está mais do que suficiente.

No que diz respeito à esfera criminal, temos que um outro adolescente, de 17 anos, assumiu ter lançado o sinalizador contra a torcida adversária. Temos um vídeo em câmera lenta, divulgado por uma TV boliviana, mostrando que apenas uma pessoa lançou o sinalizador. Vemos que, no máximo, houve outros que ajudaram aquela pessoa a fugir — o que pode ser uma ação de cúmplice, mas também pode ser apenas uma forma de evitar um linchamento de alguém que também é adolescente, que pode ter disparado por acidente, que pode mil coisas. Todas essas possibilidades devem ser analisadas durante um julgamento.

A questão é que, há 33 dias, 12 pessoas — nenhum deles sendo o jovem que assumiu a culpa pelo homicídio — continuam presas na Bolívia, tendo os pedidos de liberdade negados dia após o outro.

O que justifica essa prisão de mais de um mês de 12 pessoas, sendo que apenas uma efetivamente acionou a arma? Ultrapassamos a seara da punição ao clube e à torcida, da lição e da investigação de homicídio. O que temos ali passa a ser um sequestro internacional de 12 brasileiros.

Quem defende essa tese é alguém muito mais qualificada que eu: uma advogada criminalista que é professora livre-docente de direito penal na USP. Em texto publicado na “Folha” de hoje, cheio de pontos de exclamação, ela clama que o governo brasileiro intervenha, inclusive política e diplomaticamente, para libertar 12 pessoas inocentes que estão confinadas, sabe-se lá em que condições, num país que, no momento, tem todos os motivos do mundo para odiar corintianos e brasileiros em geral.

Eu já nem lembrava mais desse episódio. Passaram-se trinta e três dias, afinal (frise-se por extenso). Mas é justamente por esse tempo transcorrido absurdo que torna-se importante um texto como o da professora Janaína Conceição Paschoal. São 33 dias de prisão irregular de 12 brasileiros. Não nos esqueçamos mais, portanto. Voltemos com o assunto à pauta. Quanto mais o tempo passa, mais grave ele se torna, ao contrário de outras notícias que caem no limbo da velhice.

CLIQUEM AQUI para ler o texto de Janaína.

Trechos:

“(…) Estranhamente, até agora, ninguém perguntou como pode o ato de uma única pessoa levar 12 a prisão! E, pior, não parece fazer diferença o fato de nenhum dos 12 presos ter sido o autor do disparo do sinalizador.
A situação resta ainda mais problemática quando se constata que, tendo aparecido um culpado, a Justiça boliviana se nega a libertar os brasileiros, mantendo-os em cárcere até que o indivíduo se apresente! Ora, o que é isso senão um sequestro? (…)
Diante da prisão de pessoas inocentes, o país deve exigir a imediata devolução de seus cidadãos, que não podem continuar sendo usados como estandartes do rigor boliviano.
É como se, por estar no lugar errado, na hora errada, toda arbitrariedade findasse legitimada. Poder-se-ia alegar que os detidos também estavam portando sinalizadores, o que, aliás, não restou evidenciado. Mas mesmo que isso fosse verdade, por acaso, quando alguém é atropelado, o motorista que passa ao lado pode ser responsabilizado, porque, afinal, também estava dirigindo? Não tem o menor sentido!”

Por Cristina Moreno de Castro (kikacastro)

Mineira de Beagá, jornalista (passagem por Folha de S.Paulo, g1 e TV Globo, UOL, O Tempo etc), blogueira há 20 anos, amante dos livros, poeta, cinéfila, blueseira, atleticana, politizada, otimista, aprendendo desde 2015 a ser a melhor mãe do mundo para o Luiz. Antirracista e antifascista.

2 comentários

  1. Vejam quem ameaça ir à Bolívia para tentar acabar com o sequestro, de acordo com Nathalia Passarinho, do G1 em Brasília:

    “O deputado Marco Feliciano (PSC-SP), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, fará viagem oficial, como representante do colegiado, para a Bolívia para tratar da situação de torcedores corintianos presos naquele país. De acordo com a chefia de gabinete do deputado paulista, a viagem deve ocorrer na próxima semana.
    Doze torcedores do Corinthians foram presos em fevereiro após a morte de um menino de 14 anos, durante jogo da Libertadores entre o clube paulista e o boliviano San José. O adolescente foi atingido por um sinalizador lançado da arquibancada da torcida corintiana.
    PSC tem até terça para decidir sobre saída de Feliciano, diz Henrique Alves
    Protestos levam Feliciano a deixar audiência de comissão em 8 minutos
    Pastor Feliciano divulga vídeo com ataques a opositores e manifestantes
    O anúncio da missão oficial à Bolívia ocorre em meio à pressão do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), e do próprio PSC para que Feliciano renuncie à presidência da Comissão de Direitos Humanos.”
    A notícia completa pode ser lida aqui:
    http://g1.globo.com/politica/noticia/2013/03/em-meio-pressao-para-sair-feliciano-viajara-como-presidente.html

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